Wednesday, November 16, 2005

 
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language:PT-BR'>BALDANDERS






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style='language:PT-BR'>Segunda Parte


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1.

Eu acordo com o despertador. Segunda-feira. Graças a Deus, eu não preciso me levantar. Eu esfrego a planta do meu pé na sola do pé da Amanda e beijo o seu ombro. Eu ainda estou inseguro. Se não estivesse, montava em cima dela e transava loucamente com ela. Mas não vou arriscar. Ainda não sei ler os sinais dela. E o temperamento intempestivo dela sempre me assusta. Ela esfrega os olhos e senta na cama, esticando os braços como numa ola. É incrível como eu me deito com uma mulher e acordo com outra totalmente diferente. Ontem, quando eu
style='language:PT-BR'> saí do banho, a encontrei de calcinha e camiseta, de joelhos na cama, me encarando com cara de fome. Tive, obviamente, uma ereção instantânea e ela riu e me pegou com as duas mãos. Mas de manhã ela parece estar de ressaca, culpada, arrependida. Nesta, em especial, eu não me perco em autocomiseração ou especulações sobre o comportamento dela. Hoje eu vou cometer um ato de traição e não quero deixar que o arrependimento prévio me imobilize.


Hoje o Renato vai me contar sobre a sua última volta, a do presente. E como ele se recusa a me dizer porque me contratou (ele desistiu das desculpas esfarrapadas há três semanas), eu decidi, finalmente, tomar uma atitude. Fico esperando na cama até ouvir o barulho do carro da Amanda se afastando na estrada de cascalho. Eu levanto e espio pela janela. Pego o telefone e me surpreendo com o tempo que eu demoro a lembrar de um número que eu discava todos os dias.


“Alô”.


O som curto e nasal é inconfundível, mas eu confirmo.


“Arthur?”


“Esdras? Esdras seu filho da puta, onde ce ta?”


“No Vale da Cuca”


Eu me divirto com o meu tom blasé.


“Vale da Cuca? Pirou de vez? Você sumiu há mais de um mês e não manda nenhuma noticia. Sua mãe acha que você foi pra uma viagem de negócios.”


“Eu vim.”


“Que viagem de negócios? Você tem idéia do quão demitido você ta?”


Eu fico em silêncio. Eu detesto ser forçado a confrontar o efeito da minha procrastinação covarde em telefonar pro escritório. Cada dia sem ligar, a situação piorava. Até o ponto em que eu desisti e resolvi me esforçar pra simplesmente não pensar no assunto. Agora imagino que vou ter que enfrentar uma situação desnecessariamente deteriorada.


“Eu fui demitido, né?” Eu digo com a voz falhando e a temperatura do rosto elevando.


“Demitido? Olha, neste aspecto eu preciso até te agradecer. Nos primeiros dias do seu sumiço eu escutei uns quarenta xingamentos nordestinos que eu nunca tinha ouvido. E quando a Lisandra descobriu que os arquivos das propostas e apresentações, inclusive a do Banco Jóia, estavam gravadas no seu disco local – protegidas por uma senha que só você conhece – ela quase chorou de tanto ódio. Obviamente a gente perdeu a conta do Banco Jóia pra concorrência. E você sabe o quão importante era este contrato pra Lisandra. Eu, se fosse você, não aparecia por aqui. Vai que a Lisandra style='language:PT-BR'> contrata uns jagunços do pai dela pra te dar uma lição?”


Eu lembro todas as piadinhas que a Lisandra fazia sobre o Neno Bang-bang e o Cid Malvadeza, matadores profissionais da região das Usinas do pai. Segundo ela, o pai pagava quinhentas pratas pra dar sumiço em qualquer arruaceiro. Apesar do tom brincalhão, todo mundo sabia que as estórias eram mais verdadeiras do que gostaríamos de imaginar.


“Nem brinca com isso. Olha, eu liguei pra pedir um favor.”


“Favor? Você desaparece por um tempão e não manda um aviso”


“Eu mandei a minha mãe te avisar” eu interrompo.


“Sua mãe! Você não se digna a pegar o telefone pra me ligar, sua bicha!”


“Olha, Arthur, foi mal, eu fiquei meio que envolvido com esse projeto...” eu não sei por onde começar.


“Olha, Daniel, antes que eu esqueça: vai se foder!”


Eu fico esperando ele desligar o telefone na minha cara, mas sabendo que ele não vai. Um pouco porque eu sei que ele gosta de mim de verdade, mas mais ainda porque ele deve estar morrendo de curiosidade. Ele realmente não desliga, só suspira e fala.


“Fala, seu idiota, o quê que você quer.”


O Arthur trabalha na área de database marketing e é responsável pelos programas que extraem os nomes e endereços pras malas diretas, de acordo com segmentações mercadológicas. Eu sei que a PMKT compra o banco de dado do RAS, que contem todos os dados dos contribuintes do imposto de renda. A comercialização da base do RAS é proibida, mas todas empresas que trabalham com marketing direto têm uma cópia.

“Eu preciso das informações de uns nomes.”


Ele fica em silêncio por alguns segundos. ”Você lembra o que fizeram com a Clarissa, né?”


Clarissa era a antecessora do Arthur. Ela foi pega enviando pro seu email pessoal os dados da família do namorado e foi demitida sumariamente.


“Sei.”


“Então, se você quiser as informações, vai ter que me contar pra quê. Se for um bom motivo, eu dou um jeito.”


Não é tão fácil transgredir. Só o fato de contar os nomes citados pelo Renato já seria grave o suficiente. Pedir para o Arthur se meter numa potencial enrascada, pior ainda. Mas contar a estória do Renato pro Arthur já seria demais. Acho que uma mentira branca, neste caso, é mais do que justificável.


“Eu preciso confirmar a capacidade de pagamento de uns caras que estão participando deste projeto aqui.”


“Insuficiente e vago. Uns caras, um projeto. Eu preciso de mais detalhes.”


“Olha. Pega as informações que eu te conto.”


“Você é um filho da puta. Se eu for demitido vou cobrar pensão vitalícia de você.”


“Arthur. Eu confio em você. Você é um gênio do crime.”


Eu passo a lista de nomes pro Arthur. Ele diz que vai olhar à tarde e me liga de casa, à noite. Ele pede o telefone. Eu digo que não tenho e, depois de uma breve discussão, o convenço a esperar eu ligar pra ele. Como eu vou conseguir falar com ele à noite, sem chamar a atenção do Renato, da Amanda, do Marrom ou da Arlete, eu ainda não sei. Mas tenho o dia todo pra descobrir.


2.

Eu desço pra biblioteca pra encontrar o Renato. É incrível como eu já me sinto em casa depois de apenas um mês. Antes de me encontrar com ele, no entanto, eu passo na cozinha pra fazer uma boquinha. A Arlete está sovando uma massa e oferece a bochecha gorda para um beijo. Eu dou um beijo estalado, infantil e ela se derrete num sorriso. “Isso são horas? Vocês ficam namorando até tarde e a pobre da Amanda se atrasa e tem que sair correndo sem tomar café da manhã.” Ela fala tentando simular um tom de sermão, enquanto
style='language:PT-BR'>eu assalto a geladeira. “Ela que é preguiçosa e fica enrolando na cama!”. Eu falo a mentira óbvia (a Amanda é certinha demais e eu já sou o preguiçoso oficial do Vale) com a boca cheia do estonteante bolo de aipim da Arlete. Ela me ameaça com o rolo de massa. Eu saio fingindo uma fuga em direção à biblioteca.


O Renato está lendo o primeiro manuscrito da sua biografia. Eu confesso que não acreditava ser capaz de escrever tanto em tão pouco tempo. E confesso também que me surpreendi com a qualidade deste primeiro draft. É claro que o maior mérito é do próprio enredo. A estória do Renato é fantástica e obviamente mentirosa, mas não deixa de ser envolvente. Ele quis uma biografia não convencional. Sem releituras excessivas e sem a mácula do conhecimento dos eventos subsequentes. Ele quer uma biografia factual, em primeira pessoa e que coloque o leitor no tempo dos eventos, com o mesmo conhecimento style='language:PT-BR'> que o autor tinha a cada momento. Por isto ele está me contando tudo aos poucos sem dar pistas sobre a conclusão dos eventos. Exceto o fato de que o relato vai terminar com um sujeito jovem sozinho numa cidadezinha da serra carioca rodeado de empregados e sem laços afetivos aparentes, narrando a sua estória pra mim.


Eu entro na biblioteca e ele levanta os olhos do manuscrito com um sorriso. “Excelente. Parece que eu estou assistindo a minha vida no cinema, interpretada por um ator totalmente diferente de mim. Os fatos e os eventos são os mesmos, as reações do protagonista são familiares, mas diferentes. É incrível como eu não pensei ou senti as coisas que você escreveu.”


Eu não sei se isso é um elogio. “Você quer que eu reescreva?”


“Não, não. De forma alguma” ele abre um sorriso, “era exatamente isto que eu queria. Uma releitura”.


“Você já terminou a revisão? Quer continuar?”


“Você ainda não acredita.” Ele me encara.


“Não muito” eu confesso um pouco desconfortável. Apesar de esta ser a resposta óbvia, de certa forma, ao dizê-la me sinto um ingrato. “Eu só não consigo entender porque você me escolheu.”

“Você foi a inspiração para esta minha biografia.”


Muso. Nada mais gay ou idiota. Segundo o Renato, foi lendo um livro escrito por mim que ele decidiu que iria me pedir para escrever sua biografia. Obviamente, isto foi na sua segunda volta e, portanto, ainda não teria acontecido nesta vida. É uma estória confusa, que fica um pouco mais clara depois de ler a sua biografia. De qualquer forma, é só mais uma mentira deslavada.


“Eu escrevi um livro que te inspirou...” eu torço o nariz.


“Teria escrito. Mas alguma coisa que eu fiz mudou isto...” Ele fica pensativo.


“O tom da sua narração é exatamente como eu lembrava. Mas falta alguma coisa. Nesta primeira parte do livro há melancolia em excesso. Falta humor e...” Ele aperta os olhos procurando uma explicação. “Compaixão. Não. Amor, eu acho”.


Eu me sinto desapontado e frustrado. Confesso que eu me orgulho muito do que escrevemos até agora. Normalmente eu me desculparia para cavar um elogio. Mas eu estou genuinamente ferido.


Ele se levanta.


“Antes de revisarmos, porque a gente não vai até o rio?”


O Rio das Pedras é meu lugar predileto do Vale da Cuca. É um rio relativamente pequeno, de águas geladas e transparentes que escorregam ao redor de pedras lisas de diversos tamanhos e tons. A entrada para o rio fica atrás da casa, onde o rio forma uma piscina natural. Na margem desta piscina natural, uma pedra achatada convida a sentar e ouvir as águas chegando à piscina natural por uma cascata e saindo dela num desnível suave. Esta pedra achatada está coberta de minúsculas flores amarelas que caem das árvores ao seu redor.


Eu sento ao lado do Renato que fica em silêncio catando sementes e flores distraidamente. Nós ficamos em silêncio. Eu adoro a sensação de poder ficar em silêncio sem desconforto. Mas depois de alguns minutos.


“Se você acredita mesmo na sua estória, porque você não procura a Camila de novo?”


Ele não responde. Fica observando os detalhes de um dos caules das flores.


“Eu não agüentaria...” ele faz uma pausa e muda de assunto. “Olha, eu estou gostando muito do seu trabalho.”


“Eu também. Mas confesso que ainda me sinto um impostor. Você tem certeza que eu devia estar redigindo a sua biografia em primeira pessoa?”


“Absoluta.”


Nós ficamos conversando sobre detalhes do draft até a hora do almoço. Depois do almoço o Renato diz que precisa ir até Teresópolis. Eu fico sozinho na casa, revisando o manuscrito.











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